É curioso como não sei dizer quem sou.
Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer.
Sobretudo tenho medo de dizer porque
no momento em que tento falar
não só não exprimo o que sinto
como o que sinto
se transforma lentamente no que eu digo
Sou uma filha da natureza:
quero pegar, sentir, tocar, ser.
E tudo isso já faz parte de um todo, de um mistério.
Sou uma só...
Sou um ser.
E deixo que você seja.
Isso lhe assusta?
Creio que sim.
Mas vale a pena.
Mesmo que doa.
Dói só no começo.
Sou composta por urgências:
minhas alegrias são intensas;
minhas tristezas, absolutas.
Me entupo de ausências,
me esvazio de excessos.
Eu não caibo no estreito,
eu só vivo nos extremos....
a única verdade é que vivo.
Quando pequena eu rodava,
rodava e rodava em torno de mim mesma
até ficar tonta e cair.
Cair não era bom, mas a tonteira era deliciosa.
Ficar tonta era o meu vício.
Adulta eu rodo, mas quando fico tonta
aproveito de seus poucos instantes para voar...
Sinceramente, eu vivo.
_Clarice Lispector_
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