"Hoje acordei para ser feliz, nada menos que isso."

quinta-feira, 2 de abril de 2009

O meu "Eu"...

Não sei bem o que dizer sobre mim.
Não me sinto uma mulher como as outras.
Por exemplo, odeio falar sobre crianças, empregadas e liquidações.
Tenho vontade de cometer haraquiri quando me convidam para um chá de fraldas
e me sinto esquisita à beça usando um lencinho amarrado no pescoço.
Mas segui todos os mandamentos de uma boa menina:
brinquei de boneca, tive medo do escuro e fiquei nervosa com o primeiro beijo.
Quem me vê caminhando na rua, de salto alto e delineador,
jura que sou tão feminina quanto as outras:
ninguém desconfia do meu anti socialismo interno.
Adoro massas cinzentas, detesto cor-de-rosa.
Penso como um homem, mas sinto como mulher.



Não me considero vítima de nada.
Sou autoritária, teimosa, impulsiva e um verdadeiro desastre na cozinha.
Peça para eu arrumar uma cama e estrague meu dia.
Vida ca é para os gatos.
Tenho um cérebro masculino, como lhe disse,
mas isso não interfere na minha sexualidade, que é bem ortodoxa.
Já o coração sempre foi gelatinoso,
me deixa com as pernas frouxas diante de qualquer um que me convide para um chope.
Faz eu dizer tudo ao contrário do que penso:
nessas horas não sei onde vão parar minhas idéias viris.
Afino a voz, uso cinta-liga, faço strip-tease.
Basta me segurar pela nuca e eu derreto,
viro pão com manteiga, sirva-se.
Sou tantas que mal consigo me distinguir.
Sou estrategista, batalhadora, porém traída pela comoção.
Num piscar de olhos fico terna, delicada.
Acho que sou promíscua.
São muitas mulheres numa só, e alguns homens também.


A todos trato muito bem sou cordial, educada, quase sensata,
mas nada me dá mais prazer do que ser persona non grata,
expulsa do paraiso, uma mulher sem juízo,
que não se comove com nada cruel e refinada que não merece ir pro céu,
uma vilã de novela mas bela, e até mesmo culta, estranha,
com tantos amigos e amada, bem vestida e respeitada...
aqui entre nós melhor que ser boazinha é não poder ser imitada.
Martha Medeiros


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